25 março 2011
Olhares
O Jorge trouxe-me no outro dia esta foto. Não é particularmente especial. Não existe o Punctum de Barthes. É uma foto vulgaríssima de um tempo em que ser-se fotografado nada tinha de vulgar. De um tempo em que o acto de fotografar e ser fotografado era efectivamente especial. Vestia-se a melhor roupa e tentávamos fazer a pose que melhor sabíamos adequar àquilo que julgávamos ser ou que a toda a força queríamos parecer, ou que até nem disto sabíamos e apenas nos limitávamos a olhar, com ingenuidade, a lente que nos iria eternizar.
Este terá sido um desses momentos especiais de que efectivamente não me lembro, mas que certamente foi importante.
A foto de grupo ter-nos-á sido anunciada no dia anterior e as nossas mães vestiram-nos a melhor indumentária. O cabelo foi arranjado. Fomos incentivados a fazer a pose segura, a pose da posteridade.
No meio de tanta azáfama lá estávamos nós no momento certo de olhos bem arregalados para não falhar, quem sabe para não perder desde logo a posteridade. Queríamos nas entrelinhas que as nossas mães quando nos vissem se orgulhassem de nós e nos dissessem como éramos lindos e como depositavam em nós toda a confiança do mundo. Claro que esta vontade não foi possível para todos, mas bem lá no fundo todos acreditávamos nessa possibilidade.
Recordo com ternura a minha professora primária. Uma Senhora progressista para o tempo e que sempre me negou as reguadas que talvez tenha merecido. Recordo também as expressões do Jorge e do Toninho como meus amigos mais chegados.
E lá apareço eu no meio disto tudo, agora mais de trinta anos passados, olhando nos olhos do menino que era com a ternura que o tempo coloca nas coisas autênticas.
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1 comentário:
Embora nestas tenras idades e, especialmente na foto em apreço, dificilmente se distingam os sexos de alguns dos visados, julgo que a carinha bonita que se apresenta aureolada é a mais bem conseguida da referida exposição.
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