28 junho 2006

os que vão



Foste para o sul sem deixar rasto. Foste célere e
endoidecido. Estavas cheio de ideias que toda a gente pensou serem utópicas. Tu
estavas muito seguro e crente nessa viagem sem retorno. Querias outro
continente, outra vida - querias que tudo, mesmo tudo mudasse. Estranhaste
alguém poder pensar que isso era uma loucura, um devaneio. Estavas certo que
esse caminho era o teu caminho. Avançaste sem hesitar, sem te voltares para
trás. Estavas confiante e seguro que só sobreviverias enterrando metade da tua
vida. Assim foi, nunca mais voltaste, nunca mais ninguém soube de ti. Aquela
visão de criança, que um dia me contaste e em que sonhavas ser conhecido
desvaneceu-se naturalmente com os anos. Hoje tudo aquilo que querias era o
oposto, e pela primeira vez pudeste ser quem querias ser, no momento escolhido
por ti.

Nunca mais te vi desde então, mas mesmo assim não saíste de mim, e quero
acreditar que isso seja recíproco. Quanto mais não seja quando bebes um ou dois
copos de vinho bom (será que ainda bebes vinho) ou quando por acaso sobes um penhasco
qualquer e olhas do alto. Ou será que os sítios altos já não te fascinam e
vives agora ao nível do solo em vastas planícies? Não sei até que ponto mudaste,
mas também o que interessa isso. Tu quiseste ser outra coisa e isso terá sido tão
bom para ti como foi e continua a ser surpreendente e enriquecedor para mim.





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